terça-feira, 12 de agosto de 2008

Chinês cara-de-pau !!!

A voz da dona e a dona da voz. A vida pode imitar arte? Jean e Debbie
Em 1927, o cinema falado desencadeia uma revolução nos estúdios e nas produções hollywoodianas. É nessa transição que aparecem Don Lockwood (Gene Kelly) e Lina Lamont (Jean Hagen), os queridinhos do cinema mudo. Os dois participam da produção do primeiro musical, com som. Mas como comédia e tragédia andam de mãos dadas, a bela Lina tem cara linda mas não tem voz, ou melhor, tem uma voz horrível. A estreante Kathy Selden (Debbie Reynolds) é chamada para dublar a estrela. Entre trapaças, música, dança e muitas confusões, a avant premiére do filme "O patife real" acontece, no Teatro Chinês, em Hollywood. E é o grande desastre da temporada.

Parece que a vida real imita a arte na China. Lin Miaoke, a garotinha de vermelho que subiu ao palco na abertura dos jogos, usou a voz de Yang Peiyi, a garotinha que não foi considerada bonita o bastante para encantar o mundo. Chiang Qyang, diretor musical da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, com a maior cara-de-pau que o regime lhe deu, cheia de olhinhos puxados e cuidadosamente envernizada, declarou à rádio de Pequim essa pérola devidamente traduzida do mandarim para idiomas de todo o mundo: "A razão por trás disso é que precisamos colocar os interesses do país em primeiro lugar."

Lin Myoke, aos 9 anos, virou o anjo sorridente, ao soltar a voz que não era dela, cantando "Ode à Patria". A outra chinesinha, Yang Peiyi, de 7 anos, disse ao jornal chinês China Daily não ter se arrependido de ter emprestado a voz a Lin e que ficou feliz em ter participado da cerimônia.

Dá para acreditar?

Com tanta lavagem cerebral, a pequenina Yang Peiye, versão baixinha de Kathy Selden, personagem dos telões interpretada pela queridinha Debbie Reynolds, não daria outra resposta para o mundo. Mas se fosse uma criança com mais liberdade e com direitos a praticar humor negro, subiria ao palco para cantar "Ódio à Pátria". Quanto ao anjo sorridente, a pequena Lin Miaoke, vamos torcer para que ela tenha o sorriso de criança e seja criança de verdade. O mundo já está superpovoado por gente tipo Lina Lamont em todas as variações. Aliás, uma grande sacanagem do cartaz do filme é não dar destaque para Jean Hagen, grande atriz que interpretou a vilã no cinema.

A história de Singing in the Rain é meio ingênua, não sofre ataques de genialidade, mas tem cenas inesquecíveis como a dança de Genne Kelly e Cid Charisse, atriz que morreu há pouco tempo e que provocava suspiros por ter uma das pernas mais bonitas do cinema americano. Os relatos dos bastidores da época contam que na cena da Broadway Melody três turbinas de avião criavam os efeitos fantásticos do véu esvoaçante de seda usado por Cyd Charisse, com mais de sete metros de comprimento. Nada que hoje um bom software não resolvesse.

"Cantando na Chuva", de 1952, com roteiro e direção Gene Kelly e Stanley Donen, depois de 56 anos ganha versão original do patife real Chiang Qyang. Se ele era fã de Gene Kelly, para lembrar Chacrinha, o Velho Guerreiro, podemos dizer que na vida nada se cria, tudo se copia, especialmente em caso de sacanagem intelectual.

Historinhas dos bastidores

A equipa técnica usou uma mistura de água com leite para criar um efeito real de chuva, na clássica cena de Gene Kelly, obrigando-o a mudar várias vezes de roupa. Ele pegou uma baita gripe.

Nos bastidores de "Cantando na Chuva”, a cumplicidade do par romântico parecia só existir na tela: Gene Kelly acusou, em várias ocasiões, a sua colega Debbie Reynolds de não saber dançar. A atriz tinha crises de choro e era consolada por Fred Astaire, outro bailarino brilhante.

Farsa da farsa: a voz da personagem Kathy que dublava Lina Lamont, nas gravaçőes dos números musicais de Would You? e You Are My Lucky Star, não era a de Debbie Reynolds, mas a de Betty Noyes.

PS. Sessão Nostalgia. Passe na locadora, pegue "Cantando na Chuva", compre pipoca para micro e curta o filme em boíssima companhia.

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